domingo, 11 de dezembro de 2011

Por que é importante uma Arquitetura de Limites?

A seguinte postagem tomou como referencia os artigos “Arquitetura e limites” (I, II e III), de Bernard Tschumi, publicados em 1980 e 1981 na revista nova-iorquina de arte ArtForum.

      Há tempos a arquitetura vem se servindo dos princípios vitruvianos de commoditas, firmitas e venustas (comodidade, “estabilidade estrutural” e beleza), repetindo isso incansavelmente ao longo do tempo. Não é por acaso que a maioria das pessoas entende arquitetura como construção, com noções de escala, proporção e simetria, por exemplo. É certo que essas noções servem para defini-la, mas sabemos que arquitetura vai muito além de um edifício construído. A arquitetura é “o concebido”, “o percebido” e “o vivenciado”, seja nas construções, nos desenhos ou nos textos.
      Nas artes como a música, a pintura e o teatro grandes artistas às vezes destoam de sua produção principal para produzir obras que elevam as definições e interpretações: são as obras “de limite”. Ocorre que hoje os arquitetos se encontram numa “zona de conforto”, produzindo a arquitetura comercial, que envolve clientes exigentes e grandes investimentos, deixando o debate arquitetônico por vezes esquecido. As obras de limite são essenciais à arquitetura, porque desenvolvem o pensamento arquitetônico, o amplia em outras direções, explora os extremos, evitando que esta chegue ao seu fim. Cabe aqui um tipo de reflexão crítica e analítica dessas obras de limites, descartadas por muitos historiadores por serem vista como mera “arquitetura de papelão” pela falta de praticidade e/ou por fugirem aos padrões. Mas não se trata somente de estética ou geração, falamos de algo que pretende transcender a própria história e cultura, indo além das interpretações reducionistas¹ da arquitetura.

1- Bernard Tschumi chama de “reducionistas” as atitudes que negam as diferenças e os limites, que são condicionadas por “ideologias” como o formalismo, o funcionalismo e o racionalismo.

sexta-feira, 9 de dezembro de 2011

FORMA + INFLUÊNCIA

Trabalho final da disciplina Tópicos em Teoria e Análise Crítica da Arquitetura e Urbanismo ministrada pela professora Flávia Nacif. Grupo formado por:  Amanda Acipreste, Danielle Lopes , Etienny Trindade, Fábio Passos e Gustavo Tristão.


SUMÁRIO

Introdução
Forma e Influência
Zaha Hadid e a forma
Conclusão
Bibliografia


INTRODUÇÃO


      “A forma segue a função”. O principio da corrente funcionalista do século passado ainda é um dos grandes desafios na produção arquitetônica atual. “A definição de forma é simplesmente forma ou configuração” (Form and Function Today - Mary McLeod ). Desta forma, no âmbito da arquitetura, entende-se forma como a morfologia do edifício, sua organização, a relação entre cheiros e vazios, ritmo, materiais, texturas, enfim, tudo o que configura o espaço.
      Ocorre que muitas vezes a forma precede e prevalece à função, deixando o potencial da arquitetura - sua função estética, social e política - em segundo plano.
      A banalização da forma resultado da cultura capitalista vem desvinculando estes dois termos, que parecem estar cada vez mais distantes. Se a forma não atende ao propósito de uso, de que vale tal forma?  Destarte, o objeto perde toda sua riqueza estética, quando na sua conotação de experiência visual e corpórea.
 

FORMA E INFLUÊNCIA


      Nas artes autônomas como música, escultura e pintura, forma e função (com proposta social, política ou cultural) nunca estiveram separadas, diferentemente da arquitetura, que teve sua produção comprometida devido a este afastamento.
      De acordo com Odile Decq “(...) arquitetura é sempre contextual e contingente, e a forma nunca vem primeiro. Não estou interessado em fazer formas, apesar de um projeto sempre ter forma. Ao mesmo tempo, forma na arquitetura não é apenas a influência externa. É uma relação mais complexa.” A complexidade a que a autora se refere está diretamente relacionada com o sublime, ou seja, o que se espera no ato projetual, do intimo e consciente do arquiteto, bem como as experiências vivenciadas.
      Com os avanços tecnológicos a concepção da forma por vezes é banalizada. As diversas ferramentas e softwares abrem uma gama de possibilidades criativas, que por vezes nos condicionam de acordo com suas limitações. É claro que as novas tecnologias possibilitaram a construção de edificações mais complexas, bem como o Guggenheim de Bilbao, do arquiteto Frank Gehry, cuja forma só foi possível graças à estes programas de representação e experimentação. Por vezes, quando o arquiteto tem o computador como sua ferramenta principal e primeira de projeto ocorre um distanciamento do usuário uma vez que o computador elimina o contexto em que o projeto está inserido.

 Museu Guggenheim em Bilbao (fonte: edificandoonline.blogspot.com)

  Museu Guggenheim em Bilbao - interior (fonte: coolwallpapersblog.blogspot.com)


     No caso do museu de Guggenheim de Bibao ,que possui curvas esculturais, com aparência de inacabado mas extremamente harmônico , apresenta as formas desadaptadas do contexto que ele exerce. A inovação  do edifício se limita a parte externa, uma vez que seu interior apresenta as funções básicas de um museu convencional. O contrario acontece no museu Guggenheim de Nova Iorque, de Frank Lloyd Wright, que remete, em sua forma espiral, à própria historia da arte. 

Museu Guggenheim em Nova York (fonte: assimeugosto.com)

 
 Museu Guggenheim em Nova York - interior (fonte: villalobosbrothers.com)
 
      No entanto, mesmo o mais mundano e utilitário edifício tem forma, uma vez que matéria sem forma não existe. A partir da movimentação de formas primárias, simples, da geometria espacial, é possível se chegar a conformações complexas e inovadoras. Exemplo disso é o Peter Eisenman, arquiteto que mesmo antes da inovação do computador, experimentou e manipulou essas formas, com conceitos bem fundamentados. Um exemplo é o projeto da casa Guardiola, onde essa manipulação do cubo é materializada. 

 Estudo da concepção da forma da Casa Guardiola do Peter Einsenman (fonte: http://www.youtube.com/watch?v=JAH97LcQ2Cs)
 
      Função é determinada, mas não fixa, prescrita. Ela é “expansiva e transformadora” (Mary McLeod – Form and Function Today), passível de interpretações e intervenções. E é nessa relação simbiótica entre forma e função que reside o potencial estético, social e crítico da arquitetura.


ZAHA HADID E A FORMA
      A arquiteta iraquiana radicada em Londres é conhecida pelos seus projetos ousados, onde explora a fragmentação, as formas curvilíneas alongadas, fluidas e complexas. Não é por acaso que seus projetos são conhecidos internacionalmente pela originalidade e conceito.
      O mais notável nos trabalhos da arquiteta é o fato de que forma nunca vem sozinha, apenas sua função plástica. Um exemplo é o Guangzhou Opera House, localizada na cidade de Guangzhou, na China. Externamente as fachadas são formadas por panos triangulares de vidro e granito cinza-escuro apicoado, o que já deixa o edifício, a priori, bem interessante. Mas a grande surpresa está nas duas construções que abrigam um auditório cada um e um teatro com 1800 lugares. Aí, as formas orgânicas tão usadas pela arquiteta, milimetricamente estudadas, têm a função de afinar os parâmetros acústicos como reverberação, clareza e volume. Além disso, as paredes douradas com a constelação de leds fazem com que o ambiente desperte sensações únicas.

 Guangzhou Opera House (fonte: http://www.zaha-hadid.com/archive/)

 
 Guangzhou Opera House -interior (fonte: http://www.zaha-hadid.com/archive/)

 Guangzhou Opera House -interior (fonte: http://www.zaha-hadid.com/archive/)
 
      Mas experiências de formas não se detêm somente aos edifícios. A Zaha Hadid é uma conceituada design e aplica suas experiências em móveis e objetos. Um exemplo é sua cadeira Z. Mais sensato seria chamá-la de escultura. O aço inoxidável moldado em curvas sinuosas (já falamos aqui que é uma das marcas da arquiteta) cria um ritmo, de cheios e vazios, dando leveza e transparência à cadeira, o que parece fazê-la flutuar. No design clássico toda cadeira é uma cadeira, mas esta não! O que está em jogo é o discurso da forma, a experimentação, e salvo a ergonomia (a maior função de uma cadeira), ela se revela bela, elegante e única.

Cadeira Z (fonte: http://saberdesign.com.br)

 Cadeira Z (fonte: http://saberdesign.com.br)

      O “forte” da artista também está presente no design dos calçados que criou para as marcas Lacoste e Melissa. No primeiro, a peculiaridade do modelo está no formato ergonômico feito de malha metálica, que expressa a “marca do crocodilo”. Com o movimento essa malha se expande e se contrai adaptando-se ao corpo e formando um efeito de paisagem que vai se modificando. Na marca brasileira Melissa a idéia de movimento inspirou a fluidez do design. Sem fechamentos ou costuras a sandália se adequa perfeitamente ao corpo, numa relação simbiótica.

 Sapatos Lacoste por Zaha Hadid (fonte:http://dailymodalisboa.blogspot.com/2009/06/lacoste-e-zaha-hadid-lancam-coleccao-de.html)

 Melissa Scarpe por Zaha Hadid (fonte: http://www.designpvc.org/index.php/zaha-hadid.html)

 
CONCLUSÃO
 
      Forma e função não devem estar desatreladas, seja qual for o meio de concepção da forma (intuitiva, manipulação, experimentação). Arquitetura é contextual e contingente, a forma nunca deve vir primeiro, como observamos nos trabalhos dos arquitetos citados no decorrer do trabalho. Em seus projetos forma e função se completam, na falta desses elementos, o outra tem seu valor diminuído, esvaziando-se de sentido.


BIBLIOGRAFIA

Livro “The state of architecture at the beginning of the 21st century”, capítulo “Form + Influence”.

http://saberdesign.com.br/content/genial-%C3%A9-forma-cadeira-z-zaha-hadid

http://www.novonucleo.com.br/blog/index.php?i=2&cod=119

http://www.zaha-hadid.com/archive/

http://www.designpvc.org/index.php/zaha-hadid.html

http://dailymodalisboa.blogspot.com/2009/06/lacoste-e-zaha-hadid-lancam-coleccao-de.html

domingo, 27 de novembro de 2011

A Arquitetura como manifestação política


Não é segredo que o maior dos problemas que assombra as cidades é a segregação das classes. Enquanto os pobres sofrem com a falta de estrutura e a marginalidade nos subúrbios, os ricos estão em condomínios que privatizam o espaço público. Acontece que a arquitetura, pela própria lógica do sistema capitalista, de elitização e afastamento da realidade urbana, está mais interessada em produzir a elitizada arquitetura de “grife”, destinada aos estratos sociais de alta renda. De jeito algum critico quem faz esse tipo de arquitetura, mas há muito mais no que se pensar.
Como arquitetos e urbanistas não podemos ficar de braços cruzados diante das políticas, feitas para a cidade dos ricos, que se preocupam em construir mais viadutos, vias expressas e túneis, investindo o dinheiro público para favorecer a minoria que possui carros individuais. A lógica das cidades vai muito além dos condomínios murados e equipados, que aos poucos vão acabando com as possibilidades de espaços públicos. Está em uma política de urbanismo que invista no transporte público de massa, no sistema de drenagem e esgoto, que controle regularize a ocupação das periferias, fazendo uma cidade para todos.
Olhe com atenção a capa da revista Veja, edição 1684, de 24 de janeiro de 2001:




Está claro que a cidade informal é posta como indesejável, um incômodo, como se a única opção fosse a exterminação da classe pobre, que ainda é taxada na capa como criminosos (pobreza e criminalidade estão naturalmente associadas na frase). Porém ninguém contestou a monstruosidade dessa capa, nem mesmo os arquitetos que estão obrigatoriamente inseridos nessa discussão.
A profissão de arquiteto não diz somente à faceta de autoria, mas principalmente a de ser socialmente transformadora, não importando se essa ação se dê dentro de pequenos escritórios ou no governo. Como política, a arquitetura deve abastecer-se dos desafios de integrar as periferias à cidade “que funciona”, com uma urbanização que estruture os sistemas de mobilidade, saneamento ambiental, educação e segurança, entre outros. Os subúrbios devem ser reequipados para conter escolas, centro de saúde, estações de ônibus, seja em prédios novos ou não. E se essa desigualdade deriva das políticas econômicas (com a histórica concentração de renda e segregação sócio-econômica), cabe aos arquitetos e urbanistas transpor os efeitos dessas práticas segregadoras e exclusivistas, concebendo uma política mais social.

Desta forma, que tal aproveitar o nosso tempo na universidade para criar perspectivas profissionais além do escritório, passando a atuar mais em ONGs, instituições públicas e governos? De fato as argumentações sobre política e arquitetura seriam bem mais instigantes e diversas.

segunda-feira, 14 de novembro de 2011

Por um lugar ao Sol - As árvores "alegres" de Diller Scofidio + Renfro

       No ultimo post falei sobre o novo homem, nômade solitário, isolado em sua capsula tecnológica que o permite ter contato com o mundo sem sair de casa. Sendo assim, as cidades deixarão de ser cenário para as mais diversas experiências e interações?Se no conforto de suas casas ele já tem tudo o que precisa, para chamá-lo a participar da vida da cidade o convite precisa ser em excitante.
       Pensando nisso os arquitetos do estúdio Diller Scofidio + Renfro criaram a instalação Arbores Laetae (“árvores alegres”) para a Bienal de Liverpool , onde reinventaram  o uso de um parque público. Com o auxílio da tecnologia, três árvores localizada no centro do parque giram sobre círculos móveis no chão, como pode ser visto no vídeo abaixo. A cada momento uma nova configuração é formada e o usuário é chamado a participar dessa “dança”, seja sentindo os movimentos das árvores, seja observando o movimento ou mesmo na “obrigação” da troca de lugar buscando novamente a sombra ou o sol.
       Como numa inversão de papeis, as árvores agora também são atrizes que por sua vez incitam o usuário a sair de papel de espectador, que há muito encena, dando-o um novo motivo para reutilizar o espaço que se perdeu em meio de tanta tecnologia e informação.



sábado, 29 de outubro de 2011

JÁ OLHOU PRA FORA HOJE?



      Você acordou, preparou seu café, leu as noticias do seu país no seu jornal preferido e viajou o mundo numa rede de dados infinitos sem ao menos sair de casa. Se antes era preciso ir ate à banca de jornal da esquina, hoje a notícia vem até você.
      Estamos vivendo numa Era tecnológica onde quase não existem limites (o término da cidade tecnológica está no término dos dados), e para se adequar a este novo tempo, modificamos constantemente nossos hábitos e comportamento. O avanço da tecnologia encurtou as distâncias, reconfigurou a relação entre pessoas e lugares e expandiu as possibilidades de informação e comunicação: surge uma nova maneira de ver o mundo, não baseado na percepção, nas experiências individuais e coletivas entre homem e meio, mas nas representações dele pelas “falsas” janelas (TV, computador, tablet, celular,...), na interação por meio dessas máquinas tecnológicas.
     Somos agora nômades sedentários¹, viajando o mundo (super dimensionado) no conforto de nossas casas (agora cápsulas de isolamento).

     E nessa nova vida, só isso eu preciso: tomar o meu café e ter o mundo às minhas mãos.



O artigo acima tomou como referencia os textos: De interfaces tecnológicas e rascunhos de experiências, de Rita Velloso; e Cidades Fantasmas, de Fernando Freitas Fuão.


*¹ - CAUTER, Lieven de. The capsular civilization: On the city in the age of fear.

Lieven de Cauter: filósofo belga nascido em 1959 e hoje vive em Brussel. Formado em história da arte e filosofia, Leciona filosofia na escola de cinema Hij RITS, em Brussel e na Escola de Dança PARTS, também em Brussel; e pertence à Universidade Católica de Louvain, onde ensina na Escola de Arquitetura e integra, desde 1997, o grupo OSA, de pesquisa em arquitetura e urbanismo. Leciona também na Willem De Kooning Academie, em Rotterdam. Escreve regularmente nos periódicos Archis e Oase.Suas publicações incluem: Archeologie van de Kick. Verhalen over Moderniteit en Ervaring (1995), De Dwerg in de Schaakautomaat — Benjamin's verborgen Leer (1999). Ele é co-autor de Dat is Architectuur! (2001).. Em 2004 reuniu vários de seus ensaios em uma tradução inglesa, intitulada The capsular civilization: On the city in the age of fear, Rotterdam: NAI publishers, 2004. Muitos dos seus escritos estão disponíveis no site http://www.oxumoron.org.